se o passado dele fosse seu amigo
Uma vez, um grande amigo meu desses que falam com a convicção de quem leu meia dúzia de frases prontas no Instagram me disse: "As mulheres escolhem com quem vão transar. Mas só o homem escolhe com quem vai se casar." Pausa dramática. Confesso que fiquei muda por alguns segundos, não por concordar, mas por tentar entender se era machismo, insegurança ou puro medo disfarçado de filosofia de bar. Curiosa, perguntei o porquê daquela afirmação. E ele, como se estivesse recitando uma verdade universal, respondeu: "Imagina você namorar uma mulher que já ficou com vários amigos do seu grupo? Que já passou pela rodinha?" Rodinha. A palavra caiu no ar como algo sujo, carregada de julgamento e vergonha. Na cabeça dele, e de muitos, aparentemente, existia uma hierarquia imaginária onde o histórico da mulher é um fardo a ser avaliado antes de qualquer relacionamento. Como se os corpos femininos fossem fichas técnicas a serem analisadas antes da aprovação final. Passei dias talvez semanas pensando nisso. A pergunta martelava minha mente como uma daquelas inquietações existenciais que só batem às três da manhã: Será que realmente deixamos de nos relacionar com alguém só porque essa pessoa já ficou com alguém do nosso ciclo de amizade? Infelizmente, a resposta parece ser sim. E o motivo, muitas vezes, é tão raso quanto um copo de água em dia de ressaca emocional: “seria chato.” Chato pra quem? Porque, vamos ser sinceros, viver numa mesma cidade, frequentar os mesmos bares, conviver nas mesmas bolhas sociais... É praticamente impossível que nossas histórias não se entrelacem. O passado, afinal, não é uma tatuagem que dá pra esconder com maquiagem ele existe, vive ali, moldando quem somos, mesmo que muitos prefiram fingir que não. A verdade é que tanto homens quanto mulheres já caíram na armadilha de pensar: "será que posso levar essa pessoa a sério se ela já ficou com alguém que eu conheço?" Eu mesma já me questionei. E aí entra outro ponto delicado: a ideia de posse. Como se o simples fato de um corpo ter sido desejado, tocado ou amado antes, automaticamente o desvalorizasse especialmente se o outro envolvido estiver sentado na mesma mesa do churrasco de domingo. Mas o amor, minha querida, não é uma transação de mercado. Não é sobre exclusividade no passado, e sim sobre escolha no presente. O problema não está no fato de alguém já ter vivido outras histórias, mas na nossa dificuldade em lidar com o ego. Em aceitar que o que vem antes de nós não nos diminui. O incômodo que muitos sentem é mais sobre si mesmos do que sobre o outro. Porque, no fundo, o que nos ameaça não é o histórico amoroso de alguém e sim o medo de não sermos suficientemente bons para marcar presença no capítulo final. Então, da próxima vez que alguém te perguntar se você namoraria alguém que já ficou com um amigo seu, responda com outra pergunta: Você se incomoda com o passado da pessoa... ou com o seu próprio orgulho? Porque quando amadurecemos de verdade, entendemos que passado não é competição. É só o caminho que cada um percorreu para chegar até aqui. E se o seu amor verdadeiro tiver, sim, dançado com alguém conhecido... Bem, talvez seja hora de aceitar que o que realmente importa não é quem já foi, e sim quem está agora dançando com você.
Bianca Torriani
7/5/20251 min ler
Histórias
Café, amor e caos da vida nos vinte.
© 2025. All rights reserved.